Entrevista

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segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Historiador de Harvard relativiza os resultados das últimas eleições americanas e prevê novo duelo Clinton-Bush em 2016 

Por Fernanda Perrin, para a Folha de S. Paulo



Nas últimas eleições parlamentares dos EUA, os republicanos abriram a maior vantagem em relação aos democratas desde 1953, conquistando 51 cadeiras a mais na Câmara do que o partido do presidente Barack Obama.
Mas para Alexander Keyssar, 67, professor da Universidade Harvard, a vitória não pode ser vista como esmagadora diante do baixo comparecimento de eleitores às urnas, o menor em 70 anos.
Em São Paulo para lançar o livro O Direito deVoto (ed. Unesp, 618 págs., R$ 89), Keyssar falou à Folha sobre como esses resultados influenciarão a política americana nos próximos anos, em que espera uma nova disputa Clinton-Bush à presidência.

Folha - O que explica a derrota democrata nas últimas eleições parlamentares?
Alexander Keyssar - Os democratas perderam mais assentos no Congresso que imaginavam, mas o mais importante é que apenas 37% do eleitorado votou, com uma presença desproporcional de homens brancos, protestantes e com mais de 60 anos.
Os republicanos foram mais eficientes em trazer seus eleitores às urnas, mas é um erro ver nisso uma grande vitória. Se o comparecimento foi de 37% e os republicanos tiveram 52% dos votos, isso representa 19% do eleitorado.

Por que os eleitores democratas não foram às urnas?
Em alguns Estados, não havia bons candidatos. A maioria dos democratas que perderam eram de centro. Não ficou claro no que acreditavam. Democratas progressistas, que explicitaram suas posições, venceram.

Qual a agenda dos republicanos que ganharam?
Eles têm uma agenda que é real: diminuir as regulações do mercado, fazer algo em relação à imigração e reverter a reforma da saúde [conhecida como "Obamacare"], embora na prática eles não farão isso.

Por que não?
Por duas razões: não serão todos que votarão pelo fim do "Obamacare" e, mesmo que votem, o presidente vetará. Acabarão escolhendo um ou dois detalhes da legislação para reformar e então poderão dizer "fizemos algo". Há hoje de 8 a 10 milhões de pessoas cobertas pelo programa. Se ele for extinto, ou se reduzirem os subsídios, elas perderão seu seguro saúde e ficarão infelizes. Esses americanos não votarão nos políticos que tiraram seu seguro.

Se o programa é bem-sucedido, por que a popularidade de Obama está tão baixa?
Porque a economia, apesar de ter melhorado, não está bem em todos os indicadores. A renda, por exemplo, está congelada há seis anos. Ele também pareceu hesitante sobre como agir em relação ao Estado Islâmico e à crise síria.
A aura inspiradora que o acompanhou na primeira eleição, com o Nobel da Paz e a comoção que sua vitória gerou, acabou. Ele parece alguém que não conseguiu exercer a liderança necessária. Obama ainda representa dois grupos detestados por conservadores de classe média: a comunidade afroamericana e os profissionais qualificados de Harvard. E ele é um negro que foi a Columbia e Harvard, e transparece isso.

O sr. concorda que falta liderança a Obama?
Sempre houve uma ambivalência nele: como político, parece inspirador, carismático e progressista no discurso, mas no coração ele é muito cauteloso e centrista. Quando Obama foi eleito, as pessoas pensaram que ganhariam um presidente transformador, mas acabaram com um negociador. Isso é uma situação difícil de sustentar no longo prazo, especialmente quando a economia não vai bem.

Quanto às próximas eleições presidenciais, que o sr. espera?
Hillary Clinton deve ser a candidata democrata. Até lá, ela deve se distanciar de Obama e tentar agradar os progressistas, que estão insatisfeitos com ela. Mas suas posições devem ser de centro.
Do lado republicano, o candidato deve ser [o ex-governador da Flórida] Jeb Bush, filho do ex-presidente George Bush. Devemos ter uma nova disputa Bush-Clinton.


Guerra ampliou eleitorado dos EUA, diz historiador

Aclamada no meio acadêmico, a obra "O Direito de Voto", do historiador Alexander Keyssar, 67, sustenta que a expansão do direito ao voto nos EUA não foi linear. Ora o sufrágio era ampliado, ora restrito, devido às disputas entre classes sociais e à imigração.
Ele considera que a guerra também foi um fator importante, pois tornava difícil, por exemplo, excluir jovens do eleitorado, já que, se eles podiam ir para o campo de batalha, também tinham maturidade para votar.

Raio-x Alexander Keyssar, 67

Formação
PhD em história da civilização americana pela Universidade Harvard

Carreira
Foi professor no MIT e nas universidades Brandeis e Duke

Atual função
Professor de história e política social na cátedra Matthew W. Stirling Jr da Universidade Harvard